Reflexão para debate do colega Renato Pereira:
O Turismo é a actividade principal no Algarve e o produto sol-e-praia explica grande parte da procura turística. A região não pode viver de um só sector nem de um só produto. Mas é preciso reconhecer que é mais fácil desenvolver outros sectores e outros produtos em complementaridade com a mais forte actividade regional. Claro que existem nichos a explorar, de turistas que não procuram de todo os produtos baseados no nosso clima: sol-e-praia, golfe, etc., mas não têm significado suficiente para ser a alavanca da actividade económica.
Faro é a capital administrativa do Algarve. A cidade procura ocupar o seu espaço afirmando-se pela sua oferta cultural. Faro não é um destino balnear - ainda que o pudesse ser - nem tem uma oferta hoteleira relevante. Aparentemente, a vocação cultural de Faro não se concretiza ou não é percepcionada pelos turistas. Estes - os não residentes em Portugal - chegam ao Algarve essencialmente por via do Aeroporto de Faro e vão até Albufeira, Loulé, Portimão, Tavira ou outro município, mas não vão ou ficam em Faro - pelo menos em número significativo.
Exposta superficialmente a situação actual, colocam-se algumas questões: Como fazer de Faro um destino turístico? Faro pode apresentar-se competitiva do ponto de vista turístico pela sua oferta cultural?
A primeira questão, ainda que possa motivar reflexão tendente a uma fundamentada elaboração de propostas, pode também motivar, desde já, algumas ideias para discussão e avaliação:- Criação de caminhos pedestres, ciclovias e via para percurso de "comboio" turístico que ligue Faro à Praia de Faro; - Motivar a uma oferta de restauração com capacidade de atracção turística, que faça com que os turistas, ainda que alojados em Albufeira ou noutro local, se sintam atraídos a passar um dia em Faro - trata-se de atrair a Faro quem se sente atraído por, por exemplo, Olhão; - Essa oferta, com a criação dos referidos percursos até à Praia de Faro, poderia ser prioritariamente localizada à beira-ria, desde a doca, até à beira-mar, na Praia de Faro e, no sentido contrário, até à zona do cais comercial;- Reestruturação de ligações (cais, barcos, horários, acessos e serviços de apoio) às ilhas-barreira;- Criar as condições institucionais para o aproveitamento turístico das ilhas-barreira, com projectos capazes de gerar receitas que permitam gerir sustentadamente o ecossistema – neste momento as restrições de uso não impedem a autêntica “lixeira” que vai tomando conta de diversos locais;- Reafectar o uso da zona do cais comercial, para fins turísticos, usando as receitas para a gestão da zona e a relocalização da zona industrial para, por exemplo, a área adjacente ao MARF (Mercado Abastecedor da Região de Faro);- Reestruturar o porto comercial de Faro, tornando-o capaz de receber com condições técnicas e de apoio em terra – oferta comercial, beleza paisagística, transportes, etc. – cruzeiros turísticos.
A segunda questão carece de alguma caracterização adicional. Quem pensa em turismo cultural – sejam museus e outros bens tradicionalmente associados à cultura seja uma mera "movida" de animação nocturna – pode pensar em Lisboa, Barcelona, Madrid ou Bilbao, Roma, Florença, Paris, Londres ou em muitos outros destinos, mas decerto que não pensa em Faro ou no Algarve. Ainda que tenhamos alguma "coisa" cultural que possa atrair turistas, não é concerteza expectável que possamos fazer desse tipo de oferta um argumento para termos sucesso na captação de turistas. Esclarecido este ponto, fica clara a dificuldade de Faro em captar turistas como cidade com oferta cultural. Sendo realistas, teremos de aceitar que o turista que procura o Algarve também quer cultura, mas não estará decerto disponível para dedicar dois ou três dias da sua estada a visitar, por exemplo, museus. Assim, a oferta cultural de Faro terá de ser encarada, do ponto de vista turístico, como relativamente "leve", ainda que de grande qualidade. Ofertas possíveis poderiam ser: - Galerias de arte do tipo da existente em São Lourenço de Almancil - já alguém propôs que se mudassem para Faro, oferecendo facilidade na obtenção de instalações maiores, com estacionamento, etc? - Um grande museu, dedicado a algo – Lagos está a fazer por ter um dedicado aos Descobrimentos – que mereça que esse museu tenha o estatuto de "nacional". No caso de Faro, por exemplo, um Museu do Turismo, não apenas do turismo do Algarve e balnear, mas do que é o turismo como experiência de vida para o turista e actividade económica e social para quem o recebe, abarcando dimensões económicas, antropológicas e de tantas outras perspectivas, numa implementação que deveria levar a tornar-se um caso exemplar a nível internacional no tratamento desta temática. Esta faceta menos focada num produto turístico ou na oferta da região, torna Faro o local de eleição para um tal projecto, dado que é capital de um destino turístico mas a sua vida económica não se confunde com esse sector nem com nenhum produto turístico em particular. Esta hipótese está no entanto “perdida”. A sede da AEHTA (Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve) mudou-se de Faro para Albufeira, com a Câmara Municipal de Faro e não ter tido à época capacidade para o evitar e a Câmara Municipal de Albufeira a apoiar. Também para esta cidade, está oficialmente previsto a criação de um Museu do Turismo; - Já se estudou a possibilidade de existirem coleccionadores privados que, pela idade ou outras circunstâncias, estão a pensar deixar a sua colecção a um museu e que queiram viver o resto da sua vida num clima ameno. Não será possível por essa via a constituição de um museu em Faro? - A Universidade do Algarve pretende criar capacidade científica e oferecer formação na área das artes. A articulação de esforços com a autarquia pode originar a criação de capacidade interessante nesta área, com reflexos positivos para o turismo em todo o Algarve – a capitalidade de Faro obriga-a a pensar na sua actuação como estruturante de toda a região; - A Câmara Municipal de Faro já fez tudo o que está ao seu alcance para o aproveitamento dos museus da cidade: horários de funcionamento, línguas dos guias, oferta articulada dos diversos museus, com percursos definidos para a visita de dois ou mais museus, etc?- Actividades como o FICA (Festival de Cinema do Algarve) e a iniciativa Algarve Film Commission não deveriam ser mais acarinhados por Faro?
Por fim, articulando as duas questões. Não seria viável montar uma oferta de visita a Faro, durante a manhã, para os turistas que partem do Algarve em voos à tarde. A ideia poderia passar por articular com as unidades hoteleiras da região, as empresas de “transferes” e o Aeroporto de Faro que os turistas: a) Deixavam o hotel de manhã, após o pequeno-almoço e já sem carro alugado - se fosse o caso; b) Deixariam em segurança a sua bagagem, fosse no aeroporto ou noutro local – mas preferencialmente já “despachada” no aeroporto; c) Seriam conduzidos a Faro, onde visitariam a cidade velha, museus, etc. d) Almoçariam por Faro; e) Receberiam uma recordação da sua visita a Faro e ao Algarve – Faro como o momento final da sua estada! f) Seriam conduzidos ao aeroporto, a tempo do check-in, de preferência já sem necessidade de tratarem da bagagem.
Esta reflexão foi efectuada sem consulta de qualquer documentação pelo que não tem a pretensão de estar exacta ou constituir a última palavra sobre o tema. Antes pretende iniciar uma discussão sobre Faro como destino turístico.
Renato N. Pereira (
renato.n.pereira@gmail.com)